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terça-feira, novembro 16

Os Ombros suportam o mundo.


Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.

Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.


Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.


Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossege
e nem todos se libertaram ainda.

Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.

Carlos Drummond de Andrade.

3 comentários:

Wolber Campos disse...

Drumont é gênio!

Que esse tempo nunca chegue a nós. Isso é coisa da cabeça. Tanto há garotos com cabeça pesada de um ancião triste, como velhos jovens como adolescentes.

Abraços!

disse...

Me perdi aqui lendo Drummond.
Costumo dizer que sou meio "Drummondiana". Se as pessoas podem "Caetanear" também podemos "Drummondear"...

Quando vou pra Minas, na terrinha dele, fico andando pelos Caminhos Drummondianos lendo cada plaquinha, cada poema. Tirando fotos sentanda ao lado dele... rs

Muito bom esse mineiro.
"Mas as coisas findas, muito mais que lindas, essas ficarão..."

(:

* _ Pri CastRo _ * disse...

Ahhh...e Drummmondear é tão Drummond que chega a parecer coisa do Guimarães Rosa...
Rs..