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quarta-feira, março 23

Salmo 129.

"Ponho a minha esperança no Senhor. 
Minha alma tem confiança em sua palavra. 
Minha alma espera pelo Senhor."
(Salmo 129, 5 e 6).
Há 27 dias, perdi uma tia-avó muito querida vítima de um câncer, uma faca de dois gumes: partir era sofrimento, ficar era ainda mais.
A Tia Dirce tinha uma essência simples e linda, de um caráter incontestável, sempre falava o que pensava sem se importar se quem ouvia gostaria ou não. Dedicou a vida inteira a cuidar do meu Tio e dos seus quatro filhos, homens de personalidades completamente distintas e tão dignos quanto ela.
Aos 57 anos, morreu feito um passarinho, na calmaria que só visita os bons. A doença atacou o corpo, mas foi à alma que padeceu e não agüentou a dor.
Cheguei na casa dela pouco tempo depois de receber a notícia, e apesar de ter 7, talvez 8 pessoas ali, até o cachorro e a baitaca, seus eternos companheiros escondiam-se parecendo sentir o silêncio pesando nos cômodos da casa, enquanto se driblava a dor pra acertar a buracracia. 
Eu ali sem conseguir pensar direito, na casa onde brinquei infinitas vezes, onde minha filha brincou outras tantas; Na cozinha dela, onde sempre tinha pão e café fresquinhos parecia tudo tão bagunçado...
Queria chorar, mas olhava pro caçula, que só tem 13 anos, tentava mensurar a dor que ele estava sentindo, pensava no tanto que precocemente, teria de amadurecer pra agüentar a ausência da mãe...
Decidi me fazer de forte pra não piorar as coisas, afinal, é assim mesmo que a gente aprende a ser forte não é? Fiz a escolha certa. Chorei no chuveiro, lugar onde se lava as tristezas.
Tudo tem um propósito debaixo deste céu, eu sei, mas no auge do nosso egoísmo, a gente quer as pessoas do nosso lado, ainda que lhe faltem pedaços... mas quer.

A morte vem envolta na túnica negra dos arrependimentos: porque não amei mais?Porque não passei mais tempo com ela?Porque não fiz mais por ela?Por que ela?
Tira de nós as melhores expectativas, tira a esperança, enche de revolta. Finda.
Talvez, a única coisa que unanimemente temos em comum é a certeza de que a morte chegará para todos. Ainda assim, não nos preparamos pra tê-la por perto. A gente vai crescendo e de certa forma ficando calejado com as dores que ela provoca, mas não aprende como lidar com ela nem qual a melhor forma de agir quando ela finca seu cetro pesado e brilhante de eternidade no nosso chão.
Desde que meu avô (meu único pai) faleceu há muitos anos eu não me sentia tão perdida com essa história buscar fundamentos para explicar o inexplicável...
Segurei o tranco quando meu primo Fernando (que tem praticamente a mesma idade que eu, e com quem cresci brincando) me pediu para que levasse a filha dele, que é Nicole igual a minha pra se despedir da Vó Dirce. Achei que não seria capaz de escolher as palavras, com a menina no colo vendo meu primo com os lábios tremendo querendo chorar...
Ela era a única neta...
Cena comovente?Para alguns sim, para outros desnecessária, para outros ainda errada.
Para mim a certeza de que minha Tia iria embora em Paz.
Tremi durante alguns minutos depois, e desabei num turbilhão de pensamentos vendo o pranto da minha irmã, que só tem 16, perdendo a amada madrinha três dias antes do seu aniversário. No questionamento inconsolável da minha avó e outra tia, cunhadas-irmãs da Tia Dirce lamentando ter que enterrá-la tão mais jovem que as duas. No olhar vazio dos filhos dela, que suprimiam a tristeza na lembrança do triste e longo sofrimento que a mãe enfrentou antes do fim...

A morte tem dessas coisas. Te fortalece e te joga no chão.
A minha Tia está certamente bem melhor do que estava aqui, numa cama e cheia de dores. Deve estar com sua mãe e meus bisavós, de quem ela tanto cuidou.
E se é que há algo bom pra tirar de tudo isso, é essa reflexão que a morte trás consigo quando a poeira baixa. Essa vontade de rever valores e de dar verdadeiro valor a quem merece, de cuidar de quem você tem na vida, e não do que você tem.
Vai ver é essa sua função principal... Vir para que a gente dê valor à vida.
A Tia Dirce foi embora, e vai fazer muita falta pra nós. Queria poder dizer o contrário, mas... nós vamos continuar daqui, fingindo que a morte não existe e sentindo essa imensa saudade.

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Tia, que bom que fez parte de minha vida!

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